Defeito em telefone da Diretoria Geral da Câmara permitiu à reportagem ouvir conversas. Parte foi gravada
Cachoeirinha – A decisão de cancelar a Sessão Extraordinária da Câmara de Vereadores, prevista para esta quinta-feira (7), quando poderia ser concluída a leitura do relatório da CPI dos controladores de velocidade, partiu do presidente Edison Cordeiro, acatando uma sugestão da Diretoria Geral para ser feita uma higienização no plenário, assistência e antessala. A Sessão havia sido marcada atendendo pedido do vereador Fernando Medeiros com base no Regimento Interno que define ser necessária uma Extraordinária para dar continuidade a matéria não vencida na Ordinária.
O presidente da Câmara está na oposição e ela vem utilizando a apreciação das CPIs para gerar desgaste ao Governo e atrasar a votação de projetos da Prefeitura. Nenhuma das matérias enviadas ao Legislativo esse ano pelo Executivo foram apreciadas. São recursos na casa dos R$ 13 milhões que não estão podendo ser aplicados. A maior fatia é para o saneamento básico para acabar com alagamentos na cidade. São cerca de R$ 8 milhões.
Na manhã desta quinta-feira, a reportagem entrou em contato às 9h31min com a Diretoria Geral da Câmara para esclarecer com o diretor como se deu a decisão da higienização. A ligação foi feita para o número 3470.8821. Aparentemente, o telefone foi tirado do gancho e foi possível ouvir pouco mais de quatro minutos de conversa. O jornalista Roque Lopes conta que estava sem a opção de gravar e tentou printar a tela e acabou desligando o telefone. Em seguida, ele fez uma postagem em seu perfil no Facebook e excluiu segundos depois, mas ela permaneceu visível.
A postagem excluída
VAZARAM GARGALHADAS
Liguei agora para a diretoria da Câmara e tiraram o telefone do gancho, mas não desligaram. Homem e mulher conversando sobre a higienização. Gargalhadas.
Ele diz:
– a gente deu a ideia para ele e ele foi lá e …
Eu não consegui entender o que ele disse depois. Fiquei pouco mais de 4 minutos e fui tentar printar a tela e desliguei. Agora tento retornar a ligação e dá sinal de ocupado. Por favor, coloquem o fone no gancho. Estou tentando ligar. Óbvio que vão negar. Preciso encontrar uma forma de usar gravador.
Defeito no telefone persiste e áudio é captado
Roque refez a ligação mais algumas vezes e dava sinal de ocupado. Em mais uma tentativa, ela se completou e novamente ninguém atendeu ao telefone, mas foi possível ouvir a que conversavam na sala. Desta vez, utilizando outro celular, o jornalista filmou o seu aparelho com o horário e tempo da ligação, registrando as conversas.
Alguém entra na sala e comenta que uma mulher, teria sido ameaçada. Não é possível entender o contexto. Logo sem seguida o homem lê a postagem do jornalista e outra pessoa afirma: “Ele não ligou pra cá. É mentira cara”, disse. Outro comenta: “E aí bota nós contra o povo. É para nos prejudicar na verdade. Pra mim, o que tu fala, tem valor. Ele [jornalista] perdeu a moral comigo”. A qualidade do áudio é ruim, mas é possível ouvir no diálogo uma sugestão: “Só não atende mais ele”, se referindo ao jornalista.
O vereador Fernando Medeiros estava na sala e relata a entrevista concedida no dia anterior. “Ele perguntou pra mim se tu não acha que é uma manobra. Pra mim detonar [o presidente], né? … Eu não vou entrar no mérito…” A conversa continua e um pessoa diz: “… agora eu vou tirar o telefone do gancho e deixar …”, novamente questionando a veracidade do diálogo ouvido inicialmente e não gravado. A conversa em torno do jornalista segue e alguém sugere a outra pessoa: “Se tu quiser conversar com ele, tu conversa, mas eu vou te dizer, ele, grava, ele distorce tudo o que tu fala.”
Em outra parte da gravação, o vereador Marco Barbosa fala sobre comentário feito pelo jornalista na transmissão da última Sessão pelo Facebook: “O Marcou chegou aos 43 minutos do segundo tempo, só faltou botar isso.” O vereador havia chegado atrasado na Sessão.
Quem estava ou passou pela sala
Estavam ou passaram pela sala os vereadores Fernando Medeiros, Marco Barbosa e o pré-candidato a prefeito pelo Republicanos, Nerisson Oliveira, além de uma diretora, Carina Holme, indicada pelo vereador Nelson Martini, e do diretor geral indicado pelo vereador Paulinho da Farmácia. Carina e o diretor geral estão se revesando indo na Câmara em dias alternados.
Medeiros confirmou que ele estava, mas não fez referência ao demais. Ele aguardava a chegada do presidente Edison Cordeiro para tentar convencê-lo a adiar a higienização. A decisão de cancelar a Sessão foi de Cordeiro, embora a Câmara de Vereadores tenha feito postagem em seu perfil no Facebook dando a entender que a higienização tenha sido uma deliberação da Diretoria Geral.
Diretora confirma sugestão dada ao presidente
“Fizemos uma sugestão de higienização ao presidente. Quem decidiu fazer foi ele”, disse a diretora à reportagem depois das gravações e quando o telefone voltou a funcionar.
O cancelamento da Sessão foi visto como uma manobra da oposição para alongar ainda mais a leitura do relatório da CPI dos controladores de velocidade, usando ela para fins eleitoreiros, impedindo que projetos da prefeitura sejam votados. O vereador Joaquim Fortunato disse nesta quarta ao oreporter.net que Cordeiro estava brincando de presidir a Câmara e que suas decisões prejudicavam a comunidade porque a CPI tranca a pauta e impede a votação de projetos enviados pelo Executivo. Um vereador oposicionista, depois da publicação, chegou a entrar em contato com a reportagem na noite desta quarta-feira para contar que estava sendo cobrado por apoiador por fazer parte da manobra. “Eu não fiz parte disso. Quem decidiu foi o presidente, mas as pessoas acham que estou envolvido e não estou”, afirmou.
O que diz o jornalista
“O que eu ouvi não me surpreende. É óbvio que o presidente da Câmara poderia ter feito a higienização outro dia. A sugestão dada pela diretoria era o que ele precisava para prolongar a leitura do relatório cancelando a Sessão. Isto repercutiu e as duas pessoas cujas vozes vazaram pelo telefone davam gargalhadas da repercussão negativa do episódio”, destacou Roque. Ele ainda acrescentou: “Também não me surpreende o ataque a jornalistas e a imprensa. É muito fácil sair dizendo que é tudo mentira. Lamentavalemente, isso virou rotina no Brasil e nem aqui em Cachoeirinha estamos livres.”
Segundo Roque, a opinião de quem estava na sala, sobre ele distorcer fatos, não passa de uma falácia. “Não há distorção de fatos. As pessoas não gostam do que lêem quando as incomoda. É um direito delas. Todas sabem que se não gostam, basta entrar em contato que suas posições serão publicadas sem nenhum problema. Mesmo sabendo disso, não entram em contato para esclarecer o que acharam não estar adequado. Atacar a imprensa, evidentemente, é mais fácil, pois ela torna público a verdade que nem sempre convém para interesses políticos de A ou B”, salientou.
Sobre a exclusão da postagem, o jornalista explica que resolveu tentar novamente a ligação para ver se era defeito no telefone ou de fato alguém só o tirou do gancho. “Eu precisava ouvir a direção da Câmara porque tudo dava a entender que ela foi a responsável pela marcação da higienização e que o presidente nada poderia fazer e tinha desconhecimento do fato. Já tinha tentado falar com o presidente, mas ele não me atende. A assessoria de imprensa só cumpre seu papel formal, sem entrar em detalhes. Se fosse verdade que a responsabilidade era toda da diretoria, o presidente estaria sendo injustiçado pelas duras críticas que vem sofrendo nas redes sociais acusado de prejudicar a população porque projetos importantes não estão sendo votados. O que eu ouvi e parte do que gravei mostra quem fala a verdade”, concluiu.
Confira o áudio no vídeo
Nota de oreporter.net
Repudiamos todo e qualquer ataque a jornalistas e à imprensa. Realizamos um papel importante para a sociedade e damos espaço para todas as versões e opiniões sobre fatos, buscando sempre trazer à tona a verdade. O conteúdo ouvido e gravado devido a um defeito no telefone da Câmara nesta manhã foi flagrado porque o jornalista estava buscando esclarecer o episódio da higienização. Se não estivesse interessado em buscar a verdade, não teria ouvido as gargalhadas sobre o cancelamento da Sessão e comentários sobre seu trabalho.