TCE inocenta Miki na investigação do Hospital de Campanha
Procedimentos não comuns, como pagamento antecipado e sem contrato formalizado, eram medidas necessárias pela urgência
Cachoeirinha – O ex-prefeito Miki Breier não cometeu nenhuma irregularidade na contratação do Hospital de Campanha em 2020, logo no início da pandemia. A conclusão é do Tribunal de Contas do Estado (TCE), cujo voto do relator foi pelo arquivamento.
A estrutura montada no Ginásio da Fátima foi alvo de muitas denúncias e as auditorias do TCE apuraram que houve pagamento antecipado e sem contrato, o que só foi formalizado dois meses depois. O relator do processo, conselheiro substituto Roberto Debacco Loureiro, concluiu que não houve erro grosseiro ou negligência.
“Assim, o cometimento de erro grosseiro, nos termos do que dispõem a Lei Federal nº 13.655/2018 e o Decreto nº 9830/2019, com máxima vênia, no meu sentir não restou configurado, haja vista as imensas dificuldades para a prestação plena dos serviços de saúde no momento mais agudo da pandemia, as providências, mesmo que intempestivas, tomadas pelos Gestores e a instauração de processo sindicante, determinado pelo Prefeito Municipal, para a apuração de responsabilidades atinentes aos apontamentos realizados pela auditoria desta Casa, o que demonstra não ter agido com negligência”, escreveu o relator no voto.
“A decisão foi exatamente na mesma linha da defesa que elaborei”, afirma o advogado Paulo Machado. Já Miki destaca que as suspeitas levantadas na época podem ser consideradas naturais. “O importante é que não houve punição nem erro grosseiro. Fizemos o que era preciso ser feito para salvar vidas durante a pandemia”, salienta.
Confira o voto do relator:
O presente processo foi constituído para que fosse verificada a ocorrência de possíveis irregularidades na Dispensa de Licitação nº 58/2020, firmada com o objetivo de contratar empresa visando à montagem da estrutura e o fornecimento de equipamentos para o hospital de campanha de Cachoeirinha.
O aspecto que entendo pertinente destacar, para adequado juízo da matéria, é o caráter de emergência que o momento impunha, sobretudo em 2020, com inegável risco à segurança sanitária das pessoas, momento em que foram realizadas compras de bens e insumos de saúde pelo Estado e Municípios, necessários para o enfrentamento da pandemia de Covid 19, com base na Lei Federal nº 13.979/2020, bem como na Medida Provisória nº 926/2020, que flexibilizaram algumas regras previstas em lei com o propósito de tornar os processos e as ações governamentais mais ágeis.
O cenário no curso do ano de 2020, sublinho por importante, era o crescente aumento de infectados e número de óbitos, carência de leitos hospitalares e insuficiência de equipamentos e medicamentos, o que, efetivamente, implicou em grandes dificuldades talvez nunca antes enfrentadas pelos gestores públicos.
Considerando esse contexto de acontecimentos, examino as inconformidades abordadas pelo Serviço de Auditoria. No tocante ao aponte relativo à ausência de formalização contratual decorrente da Dispensa de Licitação em tela, foi firmado o Contrato de Prestação de Serviços n° 045/2020 em 29-06-2020, com efeitos retroativos e tendo sua vigência iniciada em 27-04-2020, data de inauguração do Hospital de Campanha de Cachoeirinha.
Quanto ao procedimento de reversão e incorporação dos bens ao patrimônio do Município após o pagamento do valor dos serviços e o encerramento do ajuste, constata-se que essa questão, também anotada pela auditoria, foi inserida na cláusula primeira, item 1.4, do aludido instrumento contratual. No concernente a outro ponto criticado, relacionado ao pagamento
antecipado à empresa Instituto Salva Saúde, verifica-se que a fundamentação utilizada foi o Decreto Municipal n° 6.838/2020, a Medida Provisória n° 961/2020 (editada pelo Governo Federal) e o Decreto Legislativo n° 06/2020, que, de fato, permitiram que a execução da despesa pública fosse efetuada de forma mais célere e antecipada, de modo a viabilizar, no menor prazo possível, a aquisição de equipamentos e produtos, especialmente em face das incertezas e pressões impostas pela pandemia.
Quanto à ausência de comprovantes de entrega do objeto contratado, inobstante não terem sido consignados nos autos comprovantes dos atendimentos realizados, a realidade fática revela que o hospital de campanha prestou atendimento à população de Cachoeirinha. É relevante mencionar que a Informação nº 004/2022, do Serviço de Auditoria, relata que o Contrato de Prestação de Serviços nº 45/2020 com o Instituto Salva Saúde foi encerrado em 27/07/2020 (peça 4106933), e a continuidade dos serviços prestados relativos ao funcionamento do Hospital de Campanha se consumou por meio da
contratação direta de três fornecedores, os quais já prestavam os respectivos serviços, segundo informação da Superintendência de Compras e Licitações contida no Memorando nº 1525/2020 (peça 4106933), cujos valores somados, referentes às três dispensas de licitação referidas, representou uma redução de custo da ordem de 42%.
Assim, o cometimento de erro grosseiro, nos termos do que dispõem a Lei Federal nº 13.655/2018 e o Decreto nº 9830/2019, com máxima vênia, no meu sentir não restou configurado, haja vista as imensas dificuldades para a prestação plena dos serviços de saúde no momento mais agudo da pandemia, as providências, mesmo que intempestivas, tomadas pelos Gestores e a instauração de processo sindicante, determinado pelo Prefeito Municipal, para a apuração de responsabilidades atinentes aos apontamentos realizados pela auditoria desta Casa, o que demonstra não ter agido com negligência.
Nessa linha, deixo de aplicar a multa proposta pelo Órgão Ministerial.
Com efeito, considerando que o valor global das contratações que sucederam à contratação com o Instituto Salva Saúde foi consideravelmente inferior, como afirmado pela instrução, agregado ao fato de que o Hospital de Campanha de Cachoeirinha encerrou suas atividades no início de maio de 2021, o Serviço de Auditoria propõe o arquivamento do presente processo em virtude da perda do objeto e, consequentemente, do pedido de tutela de urgência.
Diante de todo o exposto, em especial considerando que a legislação editada no período mais grave da pandemia permitiu a ampliação da discricionariedade de atuação dos agentes públicos, em consonância com o SRPA-II, proponho o arquivamento do presente feito, determinando que em próxima auditoria sejam averiguadas as conclusões resultantes do processo de sindicância instaurado, conforme informa o senhor Prefeito Municipal (p. 2, peça 2824957).
Com esses fundamentos, VOTO para que este Colenda Câmara decida nos seguintes termos:
a) pela determinação à Direção de Controle e Fiscalização para que, em
próxima auditoria, averigue o resultado do processo administrativo de sindicância instaurado pelo senhor Prefeito Municipal (p. 2, peça 2824957);
b) pela recomendação ao atual Administrador para que evite a incidência de falhas como as descritas neste Relatório e Voto;
c) pelo arquivamento do presente expediente.
Conselheiro Substituto Roberto Debacco Loureiro, Relator