POLÍTICA

Câmara debate reforma da previdência e sem ela cidade quebra

Tramita na Câmara uma Emenda na Lei Orgânica para promover alterações obrigatórias em virtude da Reforma da Previdência Nacional

Cachoeirinha – A Comissão Especial da Câmara de Vereadores realizou nesta quinta-feira (17) a segunda de três reuniões para debater a reforma da previdência municipal. No ano passado, antes do prefeito Miki Breier ser afastado, o Legislativo aprovou em primeiro turno um projeto que foi abortado depois de muita pressão do Sindicato dos Municipários. Com Maurício Medeiros no cargo de prefeito em exercício, o diálogo com a categoria foi reestabelecido e um novo projeto chegou na Câmara, com medidas mais brandas.

O tema é extremamente complexo. Ele não se resume apenas na definição de novas regras para servidores se aposentarem, centro das análises no momento. Sem a reforma, que é uma obrigação estabelecida pela Emenda Constitucional 103/19, o município que não fizer os ajustes perde a capacidade de receber determinados recursos financeiros da União.

Mas o problema não se resume a isso. Hoje, tanto servidores quanto a prefeitura, devem recolher uma alíquota de 14%. Porém, isso não é suficiente para garantir a aposentadoria e pensões de todos, tanto ativos como inativos. Para ser apurado o que falta existe o chamado cálculo atuarial composto por uma série de indicadores e muitas projeções matemáticas para 34 anos.


Hoje, Cachoeirinha tem um déficit de 1 bilhão e 95 milhões de reais, ou seja, para que todos as aposentadorias e pensões e demais benefícios sejam pagos para o número de pessoas existentes, falta esse dinheiro. Para que ele seja recolhido ao Iprec, o instituto de previdência dos servidores municipais, a Prefeitura deve pagar uma alíquota adicional progressiva. Em 2024, por exemplo, ela será de 35,66%.

Se essa alíquota extra for somada com os 14% o percentual chega a 49,66%. Hoje, a prefeitura não consegue nem recolher os 14% e vem fazendo parcelamentos. Em um quadro projetado para 2024, o percentual significa que a prefeitura poderia ter que deixar de prestar serviços a população só para recolher a obrigação previdenciária. A cidade quebraria.

É uma bomba prestes a explodir se nada for feito para desarmá-la, concorda o presidente do Iprec, Marcos Monteiro. Ele participou da reunião da Comissão Especial na Câmara e revelou alguns números. “O Iprec tem hoje um patrimônio e R$ 611 milhões, ou seja, esse patrimônio praticamente paga todos os benefícios concedidos. E nós não temos nenhum centavo no futuro para pagar os benefícios a conceder. Nós temos hoje mais ou menos 1,2 mil aposentados e pensionistas e 2.710 servidores”, disse.

Confira, na íntegra, como foi a reunião:

A prefeitura tem uma dívida de R$ 230 milhões e parte já está parcelada. “R$ 189 milhões estão parcelados e falta parcelar R$ 31 milhões … além de pagar os 14% e a alíquota adicional, a prefeitura paga hoje uma parcela de 5 milhões e 340 mil [dos parcelamentos] e isso representa retenção de todo o FPM [Fundo de Participação dos Municípios] e as vezes falta”, detalhou.

Com a aprovação da reforma, segundo Monteiro, a prefeitura poderá alongar a dívida com a previdência municipal fazendo um refinanciamento de 20 anos. Com isso, o valor mensal de pouco mais de R$ 5 milhões ficará entre R$ 900 mil e R$ 1 milhão. Vai sobrar dinheiro para ser usado para manter o recolhimento da parte patronal em dia.

Para agravar o quadro neste cenário negativo, passaram a vigorar esse ano as regras da Lei Complementar 178/21 e o Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul fez uma interpretação que coloca na despesa com pessoal o déficit atuarial. Com isso, o comprometimento da receita corrente líquida da prefeitura saltou para 55% o que inviabiliza, por exemplo, a contratação de novos servidores, exceto para algumas áreas, como saúde e educação, e cargos que ficam vagos.

Com a aprovação da reforma da previdência municipal nem tudo estará resolvido. As mudanças nas regras de aposentadorias dos servidores terão um impacto pequeno na alíquota adicional projetada no cálculo atuarial. O déficit vai cair em apenas R$ 100 milhões e a alíquota terá uma mudança muito pequena.

Depois de a Emenda à Lei Orgânica ser aprovada, outras medidas precisam ser tomadas. Segundo Monteiro disse à reportagem na tarde desta quinta-feira (17), será necessário realizar um censo previdenciário. Todos os servidores serão ouvidos para serem apuradas suas situações para a aposentadoria. Hoje, como não existe esse dado, é utilizada uma receita estimada em R$ 115 milhões, conforme as regras previdenciárias para fazer o cálculo atuarial.

Com o censo, o valor quase quadruplica em projeções já realizadas internamente na prefeitura, significando uma redução que pode chegar a R$ 400 milhões no déficit atuarial. Outra medida futura é uma alteração na legislação prevendo uma redução nas pensões. Pelo Iprec, hoje, mesmo que o aposentado faleça, o valor do benefício segue em 100%. Pela Emenda Constitucional 103/19, a pensão deve ser a metade da aposentadoria acrescida de 10% por dependente. Uma lei será enviada para a Câmara promovendo esta alteração e esse assunto ainda nem entrou em execução.

Com o conjunto de medidas a serem tomadas, conforme Monteiro, o déficit previdenciário de Cachoeirinha pode cair para uns R$ 680 milhões. Isso significa que a alíquota adicional estimada para 2024 em 35,66% pode ser reduzida pela metade. Em vez de 49,66%, somando a patronal com a adicional, pode ficar em torno de 30%, um percentual ainda alto, mas o possível.

Servidores querem mais mudanças

A Comissão Especial ainda fará mais uma reunião antes do final do mês para fechar o projeto a ser submetido ao Plenário da Câmara. São necessárias duas votações e com 2/3 dos votos para que o projeto seja aprovado. Na reunião desta quinta, o Simca, que não tem mais a figura de presidente, foi representado pela servidora Valdete Moreira. Ela não deixou de reconhecer a importância do diálogo para as mudanças na proposta. “Fomos atendidos em pontos importante sim, muito importantes, mais ainda temos que avançar em alguns pontos”, disse.

Ela argumentou que as mulheres estão sendo duplamente penalizadas, mesmo com as mudanças. “Estão sendo penalizadas duas vezes. Uma por ser mulher e outra por sermos muitas mulheres.” Ela apontou ainda que a idade mínima exigida para quem for se aposentar por exercer atividade insalubre não está correta.

A advogada do sindicato, Lúcia Helena Vidal, sustentou que embora esteja prevista em legislação nacional, a idade mínima de 60 anos para atividades insalubres é alvo de ação de inconstitucionalidade e que deveria ser revista no projeto que tramita na Câmara. Sobre a janela de 36 meses para o impacto das novas regras, ela sustentou que não deve ser aumentada a idade mínima em relação ao projeto anterior arquivado. Sobre as mulheres, a advogada também defendeu uma revisão. Para ela, a pontuação, uma das opções para fechar o tempo para a aposentadoria ser requerida, coloca as mulheres em desvantagem em relação aos homens.

O presidente do Iprec argumentou que o projeto não trata de questão de gênero e sim é meramente uma questão estatística. Segundo ele, as mulheres têm uma expectativa de vida maior na comparação com os homens e ele citou o exemplo de uma professora em efetivo exercício em sala de aula que pode se aposentar hoje com 50 anos.  “Ela contribui 25 anos e recebe em média 29 anos de benefício. Esse é o desiquilíbrio. O que ela contribui não cobre os benefícios dela, mas não é culpa dela. É uma questão de longevidade … então, temos que encontrar uma forma de equalizar de forma a garantir a aposentadoria para homens e mulheres”, disse.

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